BLOGME TENDAL CCCXIII: Infidelidade

21 Jan BLOGME TENDAL CCCXIII: Infidelidade

Havia uma vez um casal que viviam num bairro de predios onde vive gente, num “polígono residencial”, que poderiam chamá-lo. Este tipo de sítios onde há predios e predios e predios de quatro andares e ruas e passeios e contedores de lixo e pinheiros pra fazer mais agradável o lugar.
A vida do casal era a normal e previsível num casal que vive neste tipo de lugares. Até que ocorreu o que também não deixa de ser normal num casal que vive neste tipo de lugares ou noutros. Ela descobriu que ele lhe era infiel.
Quando ele chegou a casa, tão tranquilo, desatou-se a trovoada.
Ela pedia explicações que não estava interessada em atender. Berraba. Ele defendia-se das palavras com palavras, dos gestos com gestos pra evitar que lhe batesse. Mas também não tinha muita ânsia de dar explicação nenhuma.
Ela deitou-o do piso. Já arranjariam o da hipoteca.
Já viria ele pelas suas coisas.
Quando eu não esteja.
Por suposto.
E foise embora. Baixou à rua e quando ia cruzar, a voz dela berroulle:
Não faz falta que voltes pelas tuas coisas. Velaquí as tens.
E começaram a sair pela janela pra fora roupas e coisas, discos, camisas, calças, fotos, zapatos, … meias.
Todas as coisas dele voavam e iam caindo por riba dos pinheiros. Teve que afastar-se, ele e a gente que por ali estava. Deitaram-se todos à acera de enfronte a ver aquele jato de coisas que voavam. A roupa ficava presa nas pólas dos pinheiros.
Para a gente era um espectáculo, para ele era um ridículo.
Os pinheiros ficaram cubertos de roupa estendida. Convertidos num estendal desenamorado.
Apanhou a roupa que puido debaixo dos insultos da muller e o riso calado da gente.
Mas não a apanhou toda, claro. Era impossível. Havia que agavear a vários pinheiros. O vento fazia mais rechamantes as cores daquel estendal.
Daquele desamor estendido ao sol encima dos pinheiros só fica esta meia. Fosilizada. Como um coração desamado.

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